Segundo Carvalho (2004):
“Essa proposta de ensino deve ser tal que leve os alunos a construir seu conteúdo conceitual participando do processo de construção e dando oportunidade de aprenderem a argumentar e exercitar a razão, em vez de fornecer-lhes respostas definitivas ou impor-lhes seus próprios pontos de vista transmitindo uma visão fechada das ciências”
Ensinar Ciências por Investigação significa inovar, mudar o foco da dinâmica da aula deixando de ser uma mera transmissão de conteúdo.
O ensino do Átomo, no Primeiro Ciclo do Ensino Fundamental, não só é possível, como extremamente necessário. No Quinto Ano, o currículo contém temas referentes a estrutura, morfologia e fisiologia do corpo humano e os alunos precisam compreender determinados processos relacionados a hematose, respiração celular e absorção de nutrientes pelas células, o que envolve em muito o entendimento de que existem átomos e moléculas.
É importante observar, no entanto, que não se pode pretender transmitir tais conhecimentos em toda sua complexidade, pois as teorias científicas, em sua estrutura, não possuem as mesmas organizações do que é/ou deveria ser ensinado no ensino e a aprendizagem de Ciências Naturais no ensino fundamental (BRASIL, 1997).
O mais difícil, na introdução deste tema nesta faixa etária, talvez seja conseguir a abstração dos alunos dentro da idéia do átomo ser algo tão pequeno, praticamente invisível nos mais potentes microscópios, e que ao mesmo tempo forma tudo que existe ao nosso redor.
Para crianças, nesta faixa etária, este é um conceito bastante incompreensível pois, se os átomos formam tudo que existe, inclusive nós seres humanos, porque então “eu me olho e não os vejo?”
Para o aluno, o concreto torna-se primordial para o estabelecimento de regras e deduções logo, algo invisível, “não deve existir”. Isto acarreta outros questionamentos como:
- Como foi que o homem descobriu o átomo?
- Se eles não podiam ver o átomo, como resolveram dizer que existia?
É nesta etapa que o pensamento lógico, objetivo, adquire preponderância. As noções interiorizadas vão se tornando mais reversíveis e, portanto, móveis e flexíveis. O pensamento torna-se menos egocêntrico, menos centrado no sujeito. Agora a criança é capaz de construir um conhecimento mais compatível com o mundo que a rodeia. O real e o fantástico não mais irão misturar-se em sua percepção. Além disso, o pensamento dominante é o operatório porque ele é reversível: o sujeito pode retornar, mentalmente, ao ponto de partida.
Segundo PIAGET, a criança a partir dos 7 anos até os 12 anos, encontra-se capaz de interiorizar suas ações, ou seja, ela começa a realizar operações mentalmente e não mais apenas através de ações físicas típicas da inteligência sensório-motor. Este fato, permite que o professor possa utilizar a experimentação de forma investigativa, de maneira participativa, dialogada, num processo no qual cada aluno expõe as suas idéias proporcionam um ambiente favorável a apropriação dos conceitos e fenômenos. Em uma sala de aula tradicional, o professor procura valorizar as suas idéias, não permitindo um dialogo hipotético-dedutivo com a presença de hipóteses concorrentes, que servirá de ancoradouro para o processo de aquisição do objeto do conhecimento. Já, em um ambiente onde ocorrem debates acerca do fenômeno em questão, as hipóteses vão surgindo e sendo discutidas e até eliminadas no decorrer da própria aula. Tal debate é um avanço na questão das relações sociais, pois traz para a sala de aula a oportunidade de um confronto entre as mais diferentes opiniões à respeito do objeto de ensino.
“Uma atividade de investigação deve partir de uma situação problematizadora e deve levar o aluno a refletir, discutir, explicar, relatar, enfim, que ele comece a produzir seu próprio conhecimento por meio da interação entre o pensar, sentir e fazer. Nessa perspectiva, a aprendizagem de procedimentos e atitudes se torna, dentro do processo de aprendizagem, tão importante quanto a aprendizagem de conceitos e/ou conteúdos” (AZEVEDO, 2004).
Minha experiência em sala de aula
Algo que procuro fazer nas minhas aulas, após introduzir a idéia de átomo, é trabalhar com estas abstrações, pois acredito que muitas vezes os alunos não compreendem um determinado conceito, porque não compreenderam suas sutilezas, não conseguiram concretizar os detalhes apresentados sobre o que está sendo ensinado.
Assim, após caracterizar o átomo como uma partícula invisível, unidade fundamental de tudo que existe, passo, juntamente com os alunos, a buscar compreender “como o homem conseguiu formular teorias sobre algo que ele nunca viu”.
Pego duas caixas de papelão pequenas, uma com algumas bolinhas de gude dentro dela (geralmente quatro), outra vazia - ambas embrulhadas com papel de presente.
Em seguida pergunto aos alunos se eles conseguem me dizer se existe algo dentro destas caixas. A resposta óbvia é que eles não conseguem ver nada, pois estão fechadas e embrulhadas, portanto não podem me dizer se existe algo dentro delas ou não. Então deixo eles a vontade para usarem quaisquer métodos que quiserem para descobrir se existe algo nestas caixas. Peço porém para que não as abram.
Assim, balançando as caixas e sentindo o peso, eles percebem que existe algo em uma delas.
Pergunto se poderiam me dizer o formato destes objetos e se conseguem definir se há mais de um. Rapidamente eles percebem que os objetos são redondos, pois deslizam por dentro da caixa e ainda conseguem distinguir mais de um.
Esta atividade pode ainda continuar, tentando descobrir quantas bolinhas existem, do que são feitas, etc...
Após o período de observação, eu digo que eles acabaram de realizar uma experiência científica, que é mais ou menos assim que os cientistas descobrem ou descobriram as coisas que conhecemos hoje, observando, criando hipóteses e comprovando.
Esta experiência acaba ensinando aos alunos um pouco sobre a metodologia científica, comprovando que não precisamos nos valer apenas da visão para reconhecermos e identificarmos algo ao nosso redor, basta prestarmos atenção e utilizar outros métodos ao nosso alcance.
Abrimos então as caixas e verificamos se eles estavam corretos. Aí vem a conclusão: “não é porque o átomo é invisível que não podemos percebê-lo ao nosso redor.
O átomo, desta forma, começa a deixar de ser algo impensável e passa a começar a se tornar mais concreto.
Visando sedimentar estes conteúdos e levar os alunos a experimentar algo a mais em relação ao tema, ainda realizo outras experiências como encher dois balões de ar e amarrá-los a uma vareta, equilibrando a mesma ao centro com outro cordão. Um dos balões eu coloco fita adesiva e faço um furo na mesma com alfinete. A fita evita que o balão estoure e assim, o ar sai esvaziando-o lentamente. Rapidamente eles percebem que a vareta começa a pender para o lado do balão cheio, demonstrando que o ar tem peso.
Estas experiências fazem com que os alunos passem a imaginar e pensar sobre o átomo de forma diferente, permitindo com que o professor, posteriormente, consiga trabalhar com modelos e maquetes de moléculas para que vejam a fórmula da água, do gás carbônico, do oxigênio, entendam que a célula apesar de pequena possui uma membrana permeável, que a hemácea transporta oxigênio e gás carbônico, entre outros conceitos.
O átomo passa a ser mais concreto, apesar de invisível, e os alunos abstraem-se conseguindo acompanhar a lógica de seu aprendizado.
“O professor precisa saber identificar as concepções prévias de seus alunos sobre o fenômeno ou conceito em estudo. Em função dessas concepções, precisa planejar desenvolver e avaliar atividades e procedimentos de ensino que venham promover a evolução conceitual nos alunos em direção às idéias cientificamente aceita. Enfim, ele deve atuar como professor-pesquisador” (SCHNETZLER, 1992; Apud WILSEC & TOSIN, 2012).
Para um ensino de Ciências de qualidade é preciso mais do que livros, do que de apostilas, é preciso extrapolar essas instâncias de saber e proporcionar aos alunos, sobretudo os das séries iniciais do Ensino Fundamental, experiências que os permitam entender os processos científicos de maneira mais clara e significativa (LABINAS et al., 2010).
Pensar no Ensino de Ciências por Investigação, onde o aluno é conduzido a “Aprender a resolver e resolver para aprender”, implica em mobilizá-los para a solução de um problema e a partir dessa necessidade, que ele comece a produzir seu conhecimento por meio da interação entre pensar, sentir e fazer. Criar atividades investigativas para a construção de conceitos é uma forma de oportunizar ao aluno participar em seu processo de aprendizagem e permitir que assuntos abstratos como o estudo do átomo, possam serem apresentados e compreendidos com eficiência.
Referências:
AZEVEDO, M. C. P. S. Ensino por investigação: problematizando as atividades em sala de aula. In: CARVALHO, A. M. P. (Org.). Ensino de ciências: unindo a pesquisa e a prática. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2004. p. 19-33.
BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: ciências naturais. Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília : MEC/SEF, 1997. 136p.
CARVALHO, Anna Maria Pessoa de. Anna Maria Pessoa de Carvalho (org.), O Ensino de Ciências: Unindo a Pesquisa e a Prática. São Paulo. 2004. p. 1
DAVIS, C.; OLIVEIRA, Z. Psicologia na educação. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1994.
LABINAS, A. M.; CALLI, A. M. G. C.; AOYAMA, E. M. Experiências concretas como recurso para o ensino sobre insetos. Rev. Cien. Hum., UNITAU. Volume 3, número 1, 2010.
SCHNETZLER, R.P. Construção do conhecimento e ensino de ciências. Em Aberto, 11(55): 17-22, 1992.
WILSEC, M. A. G., TOSIN, J. A. P. Ensinar e Aprender Ciências no Ensino Fundamental com Atividades Investigativas através da Resolução de Problemas. Secretaria de Estado da Educação. Estado do Paraná. Disponível em <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos>. Acesso em 03/05/2012.